DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II
AOS SACERDOTES DA DIOCESE DE ROMA
Sala Clementina do Palácio Apostólico
Quinta-feira, 5 de Março de 1980
Veneráveis Irmãos
1. Ao tomar a palavra, depois das várias intervenções que se foram seguindo nesta Sala e eu ouvi com grande interesse, exprimo primeiro que tudo a minha alegria por este encontro, em que me é dado acolher os Sacerdotes da minha Diocese nas suas diversas ordens e nos seus graus. Como não me alegrar vendo ao meu lado — juntamente com o caro e zeloso Cardeal Vigário, e com Suas Ex.cias o Vice-Gerente e os Bispos Auxiliares — tão escolhida falange de Pastores, que responsavelmente contribuem para aliviar com o próprio trabalho o "peso do dia e do calor" da fadiga apostólica, que me foi confiada por Deus nesta dilecta Cidade de Roma, para a qual de toda a parte do mundo se olha como para a Comunidade "digna de Deus, digna de honra, e digna de ser proclamada feliz", porque "preside a universal assembleia da caridade" (Santo Inácio de Antioquia, Carta aos Romanos, Inscr.)?
É feliz momento de intimidade espiritual o nosso, que recorda a primitiva comunidade cristã, que o Livro dos Actos descreve como "um só coração e uma só alma" (Act 4, 32). O Senhor está connosco. É o que nos assegura a promessa que Ele fez no Evangelho a todos os que se encontram reunidos em Seu nome (cf. Mt 18, 20). N'Ele me apraz sentir hoje aqui presentes, unidos pelo comum vínculo de uma caridade fraternalmente viva e quente, também os sacerdotes que as obrigações do ministério detiveram noutros pontos. A todos quero abraçar, a todos agradecer, a todos abençoar.
2. O assunto, para o qual foi chamada a nossa atenção, reveste importância fundamental no conjunto das actividades apostólicas, em que se distribui o plano pastoral da Diocese: a formação religiosa da juventude na escola é encargo em si mesmo delicado, que as circunstâncias actuais, tanto no interior das estruturas escolares como também no âmbito mais vasto da mentalidade e dos costumes sociais, tornam singularmente árduo e, por vezes, mesmo áspero e ingrato. Desejo aproveitar esta circunstância para testemunhar, primeiro que tudo, o meu apreço e a minha estima por todos os que despendem as suas energias neste serviço altamente meritório: a eles dirijo, com afecto, uma especial palavra de complacência e de exortação, que desejaria fosse recebida como conforto e apoio nas dificuldades da fadiga quotidiana.
O pensamento vai, em primeiro lugar, para a Escola católica, cuja presença na nossa Cidade é particularmente consistente. Os qualificados manípulos de Religiosos e de Religiosas, que dedicam o melhor de si mesmos à obra educativa dentro destas Instituições, devem poder contar com a compreensão e o apoio da inteira Comunidade eclesial. A sua acção, de facto, atinge todos os dias dezenas de milhares de jovens, com os quais eles podem travar um diálogo educativo que, nascendo das mil oportunidades oferecidas pelo desenvolvimento das diversas disciplinas e valendo-se de certo estilo de vida alimentado no interior do Instituto, é capaz de exercer um influxo educativo especialmente profundo e duradouro.
Cada Pastor de almas não pode portanto deixar de olhar com fervor e simpatia para a actividade exercida pelos Institutos católicos que operam na área da Diocese, e a eles deve oferecer aquela colaboração que as circunstâncias tornam, por sua vez, possível e oportuna. Ao mesmo tempo os Directores e os Professores das Escolas católicas devem sentir o empenho de se inserirem activamente na Igreja local, mantendo com ela constantes contactos nos organismos para isso predispostos e orientando os jovens para as estruturas pastorais que, no plano tanto diocesano como paroquial, promovem iniciativas para eles orientadas. É necessário evitar formas de isolamento que afastando os jovens da participação na vida da Comunidade eclesial, correriam o risco de lhes prejudicar, ao terminarem os estudos, a perseverança na prática religiosa e até mesmo talvez nas próprias opções da fé.
3. Vem depois a Escola "pública". A este propósito, desejaria dizer imediatamente que o Sacerdote não pode ter em pequena conta as possibilidades de acção apostólica, abertas diante dele mesmo neste campo. Penso até que urge não deixar perder nenhuma das oportunidades oferecidas neste sector pela ordenação jurídica vigente. Isto já na Escola primária, em que são iniciadas as crianças no conhecimento unitário dos primeiros elementos das várias disciplinas. Como não ver nesta fase do tirocínio escolar uma importante premissa para os sucessivos progressos da evangelização? Os Sacerdotes empenhados na actividade pastoral farão bem, portanto, em aplicar-se para oferecer em tal campo, nos limites que lhes são consentidos, toda a sua colaboração, quer nos contactos com os alunos, quando devem completar o ensino religioso dado pelos Mestres de classe, quer no diálogo construtivo com os Directores didácticos e com os Mestres, e mediante toda a outra iniciativa que possa mostrar-se oportuna.
Particular cuidado é atribuído ao ensino da Religião na escola média inferior e superior. É a esse nível, com efeito, que se encontram as dificuldades maiores e as mais frequentes perplexidades, mas é também em tal âmbito que se abrem as mais estimulantes perspectivas. Ao assegurar que as reflexões, expostas por todos os que tomaram há pouco a palavra, não deixarão de constituir objecto de devida consideração, tenho o gosto de aproveitar a circunstância para recordar alguns princípios, que é necessário terem-se presentes nesta matéria, e para indicar as consequentes linhas de acção.
O princípio fundamental, que deve guiar o esforço neste delicado sector da pastoral, é o da distinção e ao mesmo tempo da complementaridade entre o ensino da Religião e a Catequese. Nas escolas, de facto, trabalha-se pela formação integral do aluno. O ensino da Religião deverá, portanto, caracterizar-se pela referência aos objectivos e critérios próprios de uma estrutura escolar moderna. Por um lado, propor-se-á, como cumprimento de um direito-dever da pessoa humana, para a qual a educação religiosa da consciência constitui manifestação fundamental de liberdade; por outro lado, deverá ser considerado como serviço que a sociedade presta aos alunos católicos, que formam a quase totalidade dos estudantes, e aos seus pais, que logicamente se presume quererem para eles uma educação inspirada nos próprios princípios religiosos. A este propósito desejo recordar o que escrevi na Exortação Apostólica Catechesi Tradendae: "E quero exprimir votos ardentes por que, em correspondência a um direito bem claro da pessoa humana e das famílias, e no respeito pela liberdade religiosa de cada um, se torne possível a todos os alunos católicos progredir na sua formação espiritual, com a contribuição de um ensino religioso que depende da Igreja, mas que, segundo os países, pode ser fornecido pela escola" ou no âmbito da escola. (cf. Catechesi Tradendae, 69).
O ensino religioso, ministrado nas Escolas, e a Catequese propriamente dita, dada no âmbito da Paróquia, embora distintos entre si não devem considerar-se como separados. Há mesmo entre ele e ela conexão íntima: idêntico, de facto, é o sujeito a que se dirigem os Educadores num caso e noutro, isto é o aluno; e idêntico é também o conteúdo objectivo, sobre o qual incide, embora com diferentes modalidades, a acção formativa, exercida no ensino da Religião e na Catequese. O Ensino da Religião pode ser considerado tanto como qualificado preâmbulo para a Catequese quanto como reflexão posterior sobre os conteúdos da Catequese já adquiridos.
4. Uma primeira consequência de semelhante apresentação do problema diz respeito directamente ao professor de Religião: deverá este tomar, cada vez mais, viva consciência da própria identidade de cristão empenhado na Comunidade eclesial, sentindo que esta olha para ele e o segue com exigente consideração no grave encargo que lhe confiou a Igreja.
O desempenho de tão delicado encargo requer preparação profissional especializada. O mestre de Religião deve, de facto, estar de posse, por um lado, de formação teológica sistemática, que lhe consinta propor com competência os conteúdos da fé, e, por outro, daquele conhecimento das Ciências humanas, que se mostra necessário como meio de apresentação, de modo adaptado e eficaz, dos conteúdos mesmos.
Semelhante esforço cristão e profissional, para conseguir manter-se à altura das exigências educativas, requer da parte dos Professores de Religião (da Escola Materna até à Média superior) o esforço de uma constante actualização nos conteúdos e nas metodologias, e o empenho de uma participação activa na vida da Comunidade eclesial.
5. Uma palavra desejaria reservar para a responsabilidade dos católicos no seu conjunto, em relação com a obra formativa realizada pela escola. É claro que a penetração da matéria religiosa é condicionada pela universalidade do contexto pedagógico, dentro do qual essa matéria se expõe. Deriva daqui a importância de uma presença respeitosa e activa dos católicos nos vários momentos do caminho formativo, percorrido pelo aluno: contributo importante poderão oferecer primeiramente os mestres católicos com o que é específico da profissionalidade deles; deverá depois ser valorizada e estimulada a acção dos pais para o eficaz papel de meditação e de diálogo, que eles podem desempenhar entre a Comunidade civil e a eclesial, sobretudo no âmbito dos órgãos colegiais; nem deverá ser menos estimado, por último, o concurso dos alunos, cujo influxo no ambiente escolar se manifestará sobretudo por meio do testemunho do estudo, da audição e do serviço.
O tempo da formação exige particulares atenções e respeito pela personalidade em maturação, do jovem. O empenho dos particulares e o projectado organicamente pela Comunidade eclesial deverão mover-se em tal direcção, com o intento de promover, em harmonia com as características próprias da escola, a serena convivência dos componentes humanos diversos por mentalidade e cultura, favorecendo que se estabeleça entre eles aquela relação de diálogo aberto e respeitoso, o único que pode conduzir a uma sociedade autenticamente civilizada.
Entre as muitas aplicações que sugere semelhante orientação, há também a que obriga os Mestres de Religião a sentirem-se responsáveis pela proposta da mensagem cristã a todos os alunos, evitando a tentação de limitar o próprio interesse a quem vive conscientemente uma opção de fé e de prática religiosa. Respeitar a todos, não excluir ninguém, procurar activamente o diálogo com todos os componentes da comunidade escolar, eis em síntese os critérios em que o Mestre de Religião deve constantemente inspirar-se.
6. Estes, filhos caríssimos, os pensamentos que era para mim urgente comunicar-vos, sobre assunto tão complexo e tão fundamental. Desejaria, antes de concluir, pedir uma vez mais à Comunidade eclesial inteira que faça convergir sobre ele o próprio empenho generoso: o que está em jogo é a formação religiosa daqueles que serão os responsáveis pela, Comunidade de amanhã. Todas as energias gastas neste sector devem, portanto, considerar-se como gastas prudentemente.
Permanece, em todo o caso e para cada um, a dificuldade de exprimir em linguagem humana coisas divinas, e de imprimir à nossa pobre linguagem aquela secreta energia que a torna persuasiva e salutar, transformando-a numa espada que penetre na intimidade do espírito: "Porque a palavra de Deus é viva, eficaz e mais penetrante que uma espada de dois gumes" (Heb 4, 12). Esta espiritual eficácia depende, mais que da capacidade e de juízos humanos, da acção transformadora da graça divina. E a graça é proporcionada oportunamente pela purificação do coração, obtida mediante a prece, a penitência e o exercício mais desinteressado e generoso da caridade. Iniciámos ontem o período quaresmal: este é o "tempo aceitável", em que é convidado cada um de nós a entrar no caminho de uma mais profunda experiência da presença, corroborante do Espírito de Cristo.
Os meus votos são que esta Quaresma seja, para cada um, tempo de interior renovação, na alegria de um contacto mais vivo com as fontes novas da graça. Com tal finalidade concedo-vos de coração a minha Bênção Apostólica, benéfica em todos os desejados confortos celestiais.
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