DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II
AO SENHOR MOHAMMAD HADI ABD KHODA'I
NOVO EMBAIXADOR DO IRÃ JUNTO DA SANTA SÉ
POR OCASIÃO DA APRESENTAÇÃO DAS CARTAS CREDENCIAIS
5 de Maio de 1997
Excelência
Estou feliz por lhe dar as boas-vindas ao Vaticano e aceitar as Cartas Credenciais, mediante as quais Vossa Excelência é nomeado Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da República Islâmica do Irã junto da Santa Sé. Grato pelas saudações da parte do seu Presidente, retribuo-lhas calorosamente, com a certeza das minhas orações ao Todo-poderoso pelo povo iraniano e pela sua paz e bem-estar.
A sua presença aqui hoje testifica os formais vínculos existentes entre a República Islâmica do Irã e a Santa Sé, bem como a nossa boa vontade em cooperar em questões de interesse bilateral e multilateral. As relações diplomáticas entre os vários Estados e a Santa Sé são verdadeiramente singulares, dado que a Sé Apostólica, enquanto goza de um antigo reconhecimento no seio da comunidade das nações e se empenha na diplomacia em conformidade com a lei internacional, possui as suas próprias características. A sua actividade diplomática reflecte esta diferença, que determina o seu modo de abordar as problemáticas de interesse tanto nacional como internacional. O Papa, como Sucessor do Apóstolo Pedro e cabeça da Igreja universal, é chamado a confirmar os próprios irmãos e irmãs na fé, revigorando a vida religiosa dos católicos em todas as partes do mundo. Portanto, não constitui uma surpresa o facto de a Santa Sé, baseando-se na amizade e na cooperação dos países onde vivem os membros da Igreja, seguir com atento interesse as suas condições de vida e o papel que desempenham na sociedade em geral.
Os católicos da República Islâmica do Irã constituem uma pequena minoria, mas estão presentes no seu País, Senhor Embaixador, desde os primeiros séculos da era cristã, e sempre fizeram parte da rica vida cultural da sua nação. A Santa Sé conta com a assistência das Autoridades iranianas para assegurar que continuem a gozar a liberdade de professar a própria fé e beneficiar de um número suficiente de Bispos, sacerdotes e outros membros religiosos. A Igreja que está no Irã, precisamente devido ao seu número exíguo, tem necessidade da solidariedade de outras Igrejas que, com a própria generosidade, estejam dispostas a contribuir com o pessoal necessário para um adequado cuidado pastoral.
A Santa Sé despende todos os esforços em vista de ajudar a comunidade católica do Irã a manter vivos os inúmeros sinais da presença cristã, a fim de que as Igrejas e os lugares sagrados no Irã não se tornem meros monumentos arqueológicos e tão-pouco sejam totalmente esquecidos. Ao mesmo tempo, essa pequena comunidade considera-se deveras iraniana, e a experiência de séculos de vida comum com os vizinhos muçulmanos pode ser extremamente útil na promoção da mútua compreensão e cooperação cada vez maiores entre os sequazes da fé cristã e os fiéis muçulmanos em toda a parte.
Esta importante questão leva-nos a considerar uma vez mais o compromisso, do qual falei com frequência e ao qual a Santa Sé adere firmemente, de promover o diálogo inter-religioso e, em particular, de desenvolver um diálogo permanente entre as religiões que possuem um comum ponto de referência na fé em Abraão. No ano de 1985, em Casablanca (Marrocos), expliquei o pensamento da Igreja acerca desta questão a milhares de jovens muçulmanos, que para lá foram a fim de me escutar: «Abraão é para nós [cristãos e muçulmanos] um mesmo modelo de fé em Deus, de submissão à Sua vontade e de confiança na Sua bondade. Cremos no mesmo Deus, o Deus único, o Deus vivo, o Deus que cria os mundos e leva as as Suas criaturas à própria perfeição» (Discurso aos jovens muçulmanos, 19 de Agosto de 1985, ed. port. de L’Osservatore Romano de 15 de Setembro de 1985, n. 1, pág. 10). Consequentemente, a Santa Sé tem confiança em que as Autoridades religiosas e os líderes governamentais hão-de colaborar, de maneira respeitosa e correcta, no crescimento do conhecimento recíproco e no progresso do diálogo comum entre os crentes e entre as religiões.
Esta referência à nossa fé no Deus único recorda-nos também o dever de trabalharmos juntos para a defesa dos valores humanos fundamentais. Vossa Excelência mencionou alguns sectores em que tal colaboração é possível, e é de bom grado que concordo com o seu desejo expresso de ver aumentar esta cooperação no futuro. Fundamentais entre os valores a tutelar são a liberdade religiosa, a liberdade de consciência e, além disso, os outros direitos que fluem da dignidade da pessoa e dos povos. De particular solicitude para os fiéis deve ser o progresso da justiça e da solidariedade, deveras essenciais para o bem-estar dos membros vulneráveis e necessitados da família humana.
Somente em um mundo de justiça e de paz as pessoas podem crescer na obediência a Deus e no serviço generoso dos seus semelhantes. A responsabilidade dos Estados em trabalhar em benefício de tal situação internacional não é uma simples exigência pragmática dos seus interesses potenciais; esta deriva da mesma natureza da responsabilidade que os líderes das nações assumem no serviço do seu povo. O respeito pela lei internacional e o empenhamento na negociação como modo de resolver tensões — também com a assistência da própria comunidade internacional, se for necessário — constituem imperativos da tarefa de edificar um mundo melhor, em que possam florescer a bondade e a religião. Hoje, todos nós devemos esperar e fomentar uma nova fase de cooperação internacional, mais solidamente fundamentada sobre a solicitude humanitária e a assistência efectiva a quem sofre, e menos dependente do cálculo insensível dos intercâmbios e benefícios técnicos e económicos.
As profundas tradições islâmicas do Irã e a sensibilidade religiosa do seu povo e dos seus líderes constituem motivos para uma bem fundada esperança de maiores abertura e cooperação com a comunidade internacional. Por sua vez, a Santa Sé estará sempre pronta a trabalhar em harmonia com aqueles que servem a causa da paz e salvaguardam a dignidade humana com que o Criador beneficiou cada ser humano.
Excelência, façolhe votos de bem no momento em que inicia a sua sublime missão como Representante diplomático do seu País junto da Santa Sé, assegurando- lhe a pronta cooperação dos vários departamentos da Cúria Romana. As minhas orações estão repletas de confiança de que o Altíssimo há-de derramar as Suas abundantes bênçãos sobre Vossa Excelência e sobre o querido Povo iraniano.
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