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DISCURSO DO PAPA PAULO VI
AOS PARTICIPANTES NO CONGRESSO
 DO MOVIMENTO «PAX ROMANA»

Quarta-feira, 21 de Julho de 1971

 

Caros Filhos e caras Filhas:

O quinquagésimo aniversário da fundação da Pax Romana requer uma comemoração, digna dos acontecimentos significativos da vida da Igreja. Merece, ao mesmo tempo, uma reflexão profunda sobre o papel que a Igreja exerce no mundo de hoje pela presença e pela acção dos seus filhos, que se encontram na vanguarda do pensamento e da pesquisa, e nos lugares de síntese e direcção na sociedade contemporânea.

Esparsa por mais de 80 países de todos os continentes, com os seus dois Movimentos, de Estudantes e de Intelectuais, e os seus Secretariados profissionais, Pax Romana, realmente, apresenta aos nossos olhos uma imagem da própria Igreja: Povo de Deus inserido num mundo em mutação, solidário nas alegrias e nas esperanças, nas tristezas e nas angústias dos homens deste tempo (cfr. Gaudium et Spes, 1), rica de toda a diversidade de culturas e tradições humanas, talvez percorrida pelas mesmas tensões que desintegram o mundo de hoje, mas forte por meio de uma Presença unificante, que é a de Cristo Salvador, que vive em todos os seus membros.

Outras pessoas, no decurso das vossas celebrações, terão voltado a traçar as etapas de meio século de história, cujos frutos também vemos: de uma história ligada à cidade de Friburgo e à da sua Universidade, que acaba de vos acolher, e da qual, felizmente, ainda se encontram pioneiros entre vós — mas como deixar de evocar, aqui, a memória, entre muitas outras, do primeiro « peregrino » da ideia da Pax Romana, Georges de Montenach, e, mais próxima de nós, a do Abade Joseph Gremaud, cuja recordação vos reuniu em oração durante os vossos dias de estudo?

As etapas desta história também estão ligadas, por milhares de laços, a esta Cidade dos Apóstolos Pedro e Paulo, a esta Roma « onde Cristo é Romano » (Dante, Divina Commedia, Purgatório, XXXII, 102). Porque, mais ainda do que um nome, a Pax Romana foi sempre para vós um lema, recordando aos universitários e aos intelectuais católicos o seu compromisso cristão de construir a paz sobre as bases sólidas da justiça e do amor. (« Se queres a paz, trabalha pela justiça »: é o próprio tema que escolhemos para o V Dia Mundial da Paz).

O historiador poderia remontar ao fim do século XIX, às primeiras tentativas de reunir, em Roma, uma União internacional dos estudantes católicos — mas este projecto, abençoado pelo nosso grande Predecessor, o Papa Leão XIII, só se viria a realizar uns trinta anos mais tarde, num mundo desintegrado pela primeira guerra mundial, maduro, finalmente, para esta vontade generosa de tornar a criar a paz por meio da reconciliação dos corações e de uma acção comum de universitários cristãos, conscientes das suas responsabilidades intelectuais e sociais. Recordemos, sobretudo, outros acontecimentos ainda frescos para alguns de vós: as «jornadas » de Roma de 1947, após um conflito ainda mais desastroso; nova partida de uma Pax Romana já espalhada pelo mundo inteiro, e pronta, nas suas estruturas renovadas, para dimensões novas das tarefas da comunidade mundial. Depois, durante o Ano Santo de 1950, esta Peregrinação deu-nos a alegria de um encontro de fé e de oração, no Coliseu, com estudantes e intelectuais de todas as regiões do mundo.

Mas não se trata hoje, caros Filhos e caras Filhas, de nos determos em simples evocações do passado. O vosso Cinquentenário convida mais a voltar o olhar para o futuro. É esta a razão por que gostaríamos de vos convidar, jovens e pessoas de idade, a aprofundar, cada vez mais, na linha do tema escolhido para as vossas Assembleias de Friburgo, o sentido cristão da libertação do homem, pela qual tendes a ambição de trabalhar nos próximos anos.

Mais do que nunca, realmente, na sua busca de uma autêntica liberdade, os homens têm necessidade de procurar o seu verdadeiro sentido junto de Cristo-Libertador.

Libertação... Esta palavra encontra-se hoje em todas as bocas; aparece nos mais diversos escritos; as ideologias mais opostas utilizam-na. Também, como acontece com todas as grandes e legítimas aspirações humanas, necessita, para conservar o seu sentido cristão, de ser constantemente esclarecida, no decurso dos acontecimentos da história, pela humilde escuta da Palavra de Deus, pelo estudo atento dos documentos do Magistério, pelo confronto leal entre o que está para nascer e a fé viva da Igreja.

Assim, é apenas o homem cristão que pode tornar-se um artífice, cada vez mais eficiente, da libertação segundo Cristo Jesus, que « abriu a todos os homens o caminho feliz da liberdade dos filhos de Deus » (Lumen Gentium, 37).

Olhemos para Ele um instante. Ele, o homem livre por excelência. Certamente vemo-1'O atento — e quanto! — aos males, de qualquer espécie, que gravam sobre os seus irmãos: « Vinde a Mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e aliviar-vos-ei» (Mt 11, 28). Mas é à causa profunda que Ele se dedica em todas as ocasiões, é do pecado que Ele quer libertar o homem, libertar da empresa do mal, que cada um descobre dentro de si próprio e que o acorrenta ao seu egoísmo, ao seu orgulho, aos seus apetites carnais; pecado individual, que as influências colectivas vêm multiplicar e onde é preciso procurar a origem das opressões e dos servilismos, que segregam as sociedades humanas, embora, na aparência, sejam grandemente religiosas: «Este povo honra-Me com os lábios, mas o seu coração está longe de Mim ».

Ê ao coração dos homens que Jesus Cristo fala, para lhes abrir os caminhos de liberdade. Ele crê na capacidade de todos os homens, até do mais acorrentado, de alcançarem a verdade e o amor e de se tornarem os instrumentos da sua própria libertação, desde que trabalhem juntos.

A libertação que Ele lhes propõe não é uma concessão da lei moral, mas, independentemente de qualquer legalismo, é uma tensão constante para a perfeição cristã, para a — usemos a palavra — santidade (cfr. Lumen Gentium, cap. V), para o absoluto do amor de Deus e do próximo: « Amarás... com todo o teu coração ...» (Lc 10, 27).

Liberdade do amor que impede todo o mero formalismo, exclui todas as formas de racismo, abre completamente o coração ao Espírito que « sopra onde quer » (Jo 3, 8).

Liberdade do amor que é obediência a Deus, aceitação humilde e confiante de se deixar conduzir por Cristo e pela Igreja: « outro te cingirá e te levará para onde tu não queres » (Jo 21, 18).

Liberdade do amor que, finalmente, é participação no sacrifício do Senhor, no seu mistério de morte e ressurreição. É a nossa fé em Cristo, Salvador pela Cruz, que nos leva a crer na possibilidade da libertação de todos os homens e da sua reunião na unidade. É a nossa fé na sua Ressurreição que alimenta em nós, para todos os nossos irmãos, « a esperança da glória».

Competirá, em grande parte, aos vossos Capelães — que saudamos especialmente no meio de vós — ajudar-vos, jovens e pessoas de idade, a viver as vossas lutas humanas pela verdade, a justiça e a paz, à luz d'Aquele que é o Caminho, a Verdade e a Vida.

Os membros da Pax Romana saberão, assim, assumir a sua plena responsabilidade na Igreja, felizes por colaborar «com aqueles que procuram os mesmos objectivos» (Gaudium et Spes, 43).

Não esquecemos, por fim, por termos tido um testemunho disso, que a Pax Romana desempenhou um papel de pioneiro na constituição das Organizações católicas internacionais, ultrapassando o quadro muito limitado de cada nação. Além disso, ela inaugurou um modo de presença, discreto mas eficaz, da Igreja junto dos Institutos da comunidade mundial. Hoje, com a mesma orientação, deveis, muitas vezes, trabalhar com homens de boa-vontade, de todos os horizontes, porque «virá um dia em que as relações internacionais hão-de possuir o cunho do respeito mútuo e da amizade, da interdependência na colaboração e da promoção comum sob a responsabilidade de cada indivíduo» (Populorum Progressio, 65). Sois, portanto, levados a colaborar, não só com os vossos irmãos católicos, mas também com os cristãos que participam na busca ecuménica, e com os não-crentes. Evitai, entretanto, que se dissolva a vossa identidade de Organização Católica: mesmo na busca de situações mais humanas, sede testemunhas da visão católica que vos é própria. Por outro lado, é assim que prestareis melhor serviço a todos.

Estas observações pretenderam apenas sublinhar alguns aspectos mais importantes da natureza e da actividade dos vossos dois Movimentos. Para terminar, é com alegria que reiteramos não só as nossas felicitações por ocasião do seu Cinquentenário, mas também a nossa confiança na Pax Romana. A vós, queridos Filhos e queridas Filhas do MIIC e do MIEC, afirmamos, mais uma vez, que contamos com a vossa fidelidade, com o vosso senso de responsabilidade, com o vosso diálogo e a vossa colaboração confiante com os vossos Pastores, no cumprimento da missão da Igreja e ao serviço de toda a família humana.

De todo o coração, damo-vos a nossa Bênção Apostólica.

 



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