DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II
AO CORPO DIPLOMÁTICO ACREDITADO
JUNTO DO ESTADO FILIPINO
Manila, 18 de Fevereiro de 1981
Excelências, Senhoras e Senhores,
1. Vim a esta parte do mundo para me encontrar com as comunidades católicas das Filipinas e do Japão e para dirigir a estas duas nações a expressão de profunda estima que a Igreja alimenta para com elas. Ao mesmo tempo é-me muito agradável ter o ensejo de estar convosco nesta tarde, uma vez que, como diplomatas acreditados junto do Governo deste país, representais os povos não da Ásia mas do mundo inteiro. Em seguida, segundo o meu programa, dirigir-me-ei directamente a todos os povos da Ásia; mas não posso deixar que se perca a presente ocasião sem exprimir aqui, diante de vós, a alegria que encontro em saudar, nas vossas pessoas, as populações e os governos das vossas nações, muitas das quais mantêm cordialíssimas relações com a Santa Sé. Desejo manifestar de novo a profunda estima, que a Igreja alimenta pelas nobres tradições culturais e religiosas de todos os povos, e reafirmar o seu desejo de estar ao serviço de todos na comum busca da paz, da justiça e do progresso humano.
2. A Igreja não tem ambições políticas. Quando oferece o seu próprio contributo aos grandes e sempre actuais problemas da humanidade — paz, justiça, desenvolvimento e todo o meritório esforço tendente a promover e defender a dignidade humana — fá-lo por estar convencida de isto estar incluído na sua própria missão. Missão que está ligada a salvar o homem: o ser humano na sua totalidade, a pessoa individual que actua e segue a sua vocação eterna na história temporal, no interior de um complexo de comunidades e de sociedades. Quando dirige a própria atenção para as necessidades e as aspirações dos indivíduos e dos povos, a Igreja segue o mandamento do seu Fundador, pondo em prática a solicitude de Cristo por cada pessoa em particular, especialmente pelos pobres e pelos que sofrem. O seu contributo específico, para a humanização da sociedade e do mundo, deriva de Jesus Cristo e do Seu Evangelho. Mediante o ensinamento social que ministra, a Igreja não apresenta modelos pré-fabricados, nem alinha comportamentos segundo a moda e passageiros. Pelo contrário, referindo-se a Cristo, tende a transformar os corações e os espíritos, de maneira que o homem possa ver-se a si mesmo na plenitude da própria humanidade.
3. A acção da Igreja, portanto, não é política, nem económica, nem técnica. A Igreja não tem competência nos sectores da tecnologia e da ciência, nem se afirma graças ao poder político. A sua competência, como a sua missão, é por natureza religiosa e moral, e deve manter-se no seu próprio sector de competência, se não quer que a sua missão seja ineficaz e irresponsável. É hábito da Igreja, por isso, respeitar a área específica de responsabilidade do Estado, sem interferir no que pertence aos políticos e sem participar directamente na direcção dos negócios temporais. Ao mesmo tempo a Igreja anima os seus membros a assumirem as próprias plenas responsabilidades como cidadãos de uma dada nação e a procurarem, juntamente com os outros, os caminhos e os modelos que melhor consigam fomentar o progresso da sociedade. Considera como seu contributo específico reforçar as bases espirituais e morais da sociedade, e, a fim de prestar serviço humanidade, ajuda as pessoas a formarem rectamente as próprias consciências.
4. À luz destas considerações, desejo que a minha viagem através da Ásia venha a constituir chamamento à paz e ao progresso do homem, incentivo para todos os que estão empenhados em proteger e promover a dignidade de cada ser humano. Espero também que o meu encontro convosco, nesta tarde, reforce o vosso sentido de missão ao serviço dos vossos países e da família humana inteira. Não é acaso missão do diplomata ser construtor de pontes entre as nações, ser especialista no diálogo e na compreensão, ser defensor da dignidade do homem, a fim de promover o bem comum de todos?
Além de promover os legítimos interesses do vosso país, a missão, que desempenhais, orienta-vos de modo especial para os mais vastos interesses da inteira família humana, especialmente no continente asiático. Inspirados como vos mantendes pelos mais nobres ideais de fraternidade, vós — disso estou certo —querereis partilhar do meu interesse pela paz e pelo progresso nesta área, compreendendo a necessidade de enfrentar as causas mais profundas dos problemas que afligem nações e povos. Na minha recente encíclica sobre a Divina Misericórdia indiquei aquelas coisas que julgo serem "as fontes de inquietação". Falei do temor ligado à perspectiva do conflito que — atendendo aos arsenais de armas atómicas — poderia significar a parcial auto-destruição da humanidade. Chamei a atenção para aquilo que os seres humanos poderiam fazer aos outros homens servindo-se dos meios colocados disposição de uma tecnologia militar cada vez mais refinada. Mas, atraí a atenção também para outros elementos, escrevendo: "O homem tem com razão medo de ser vítima de uma opressão que o prive da liberdade interior, da possibilidade de exteriorizar a verdade de que está convencido, da fé professada, da faculdade de ser a voz da consciência que lhe indica o recto caminho que deve ser seguido. Os meios técnicos a disposição da civilização hodierna encerram, de facto, não só a possibilidade de uma auto-destruição devida a um conflito militar, mas também a possibilidade de uma sujeição "pacífica" dos indivíduos, dos campos de trabalho, de sociedades inteiras, e de nações, que por qualquer motivo possam mostrar a sua incomodidade àqueles que dispõem dos relativos meios e estão prontos a servir-se deles sem escrúpulo" (n. 11).
Mencionei também o trágico problema de todos os que sofrem por causa da fome, da má alimentação e do crescente estado de desigualdade entre indivíduos e nações, porque "ao lado daqueles que são abastados e vivem na abundância, existem os que vivem na negligência, sofrem a miséria e muitas vezes até morrem de fome." (ibidem).
5. Mas no mesmo documento também declarei (e desejaria deixar também este pensamento à vossa reflexão): "A experiência do passado e do nosso tempo demonstra que a justiça sozinha não basta e que pode até levar à negação e ao aniquilamento de si mesma, se não se consente àquela força mais profunda, que é o amor, plasmar a vida humana nas suas várias dimensões" (n. 12).
Sim, caros amigos, a minha mensagem desta tarde, a vós dirigida, diz exactamente respeito ao poder do amor. O amor profundamente sentido e manifestado na prática em acções concretas, individuais e colectivas, é força motora que impele o homem a ser verdadeiro consigo mesmo. Só o amor pode tornar o homem realmente disponível para o apelo da necessidade. E a mesma força, o amor fraterno, oxalá vos conduza aos cimos cada vez mais altos do serviço e da solidariedade.
Senhoras e senhores, na alta missão diplomática como é a vossa, contai com o meu apoio total.
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